O papel e posição do ensino de lógica na formação intelectual clássica

O papel e posição do ensino de lógica na formação intelectual é pergunta frequente que me fazem.

A resposta, embora simples, não é de fácil exposição. O tema é muito antigo, tão antigo quanto a disciplina da lógica/dialética, e tem sido alvo de acaloradas discussões desde sua origem.

Historicamente, as respostas se dividem em dois grupos: aqueles que defendem a lógica como uma disciplina filosófica de direito, e aqueles que sustentam ser ele apenas um instrumento (uma ferramenta) para o exercício da filosofia.

Representantes do primeiro grupo são os estoicos e os neoplatônicos (a posição dos últimos é dúbia, como geralmente o é), do segundo, Aristóteles (o pai da lógica). Tal diferença não é pequena, e suas implicações são profundas.

No mesmo fôlego, temos outra questão, ainda mais relevante: a pergunta quanto a ordem de ensino dessa disciplina (seja uma disciplina de direito, ou apenas um instrumento). É nessa esfera de reflexão que o neoplatonismo mostra seus efeitos mais duradouros e devastadores.

Podemos encontrar no neoplatônico Olimpiodoro, um dos últimos professores pagãos do ocidente, um ponto de partida para entender essa questão. Para ele, o ensino da lógica deveria preceder o da ética. Na verdade, a lógica era a disciplina primeira na ordem do aprendizado. Seu argumento era simples, sem a correta estrutura racional (i.e, a estrutura formal), não se pode pensar corretamente sobre qualquer matéria.

Isso está errado? Claro que não!

Qual o problema aqui então?

O cavalo de Tróia…

Ao sujeitar a reflexão ética ao ensino da lógica, Olimpiodoro na verdade impõe uma cosmovisão em que a ação moral está sujeita a razão humana. Ele entende que a razão, se corretamente disciplinada, pode vencer a conduta viciosa e injusta (o pecado pode ser vencido pela razão humana). Nesse contexto, o homem intelectual se torna mais espiritual, mais santo do que aqueles que não cultivam a vida do intelecto.

Como agravante, o próprio conceito de racionalidade introduzido é o neoplatônico, no qual a razão é reduzida a sua dimensão matemática e suas estruturas formais esvaziadas de sentido.

Além disso, temos aqui também crença dualista da superioridade da forma sobre a matéria, do formal sobre o concreto. Nesse sentido, as ações éticas voltadas para o mundo físico acabam por ser relevadas em detrimento das ações do espírito, isto é, da educação das paixões superiores. Nesse ponto, o homem, pelo exercício introspectivo do domínio das paixões, torna-se o centro e fundamento da ação moral.

O que isso importa? Bem, e se eu lhes dissesse que os desdobramentos filosóficos/teológicos/políticos da conjunção desses dois fatores são catastróficos… em verdade, que o nosso tempo é a manifestação física de seus efeitos?

Parece relevante, não é?

 

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